Reconstrução do PanAmericano visa ocupar lacunas do mercado
É no andar de número 13 – o do azar, para os supersticiosos – de um prédio na avenida Paulista, em São Paulo, que a operação do banco PanAmericano está sendo reconstruída. Ali, numa sala em que as divisórias foram derrubadas, estão instalados, ainda precariamente, executivos recrutados para reerguer a instituição. Ao redor de um mesão de mobília improvisada, o time comandado por José Luiz Acar, sócio do BTG Pactual e ex-vice-presidente do Bradesco, começa a colocar em ação o novo plano de negócios do banco que, até janeiro, pertencia ao apresentador e empresário Silvio Santos.
Apenas um andar acima, no 14º, ainda sobrevivem duas salas forradas de móveis de madeira escura, praticamente idênticas, uma de frente para a outra. Seus donos não estão mais lá, mas qualquer um sabe dizer que uma era ocupada por Rafael Palladino, ex-presidente do PanAmericano, e a outra por Luiz Sandoval, ex-presidente do grupo Silvio Santos e do conselho do banco.
O contraste entre os andares reflete a transformação que vem sendo feita no banco desde que o BTG Pactual assumiu o controle do PanAmericano em fevereiro, depois de um resgate que evitou a quebra da instituição após a descoberta de fraude bilionária. As mudanças são muitas e vão bastante além da mobília. Modelos de contratos de financiamento estão sendo revistos, processos de aprovação de crédito e de cobrança são aprimorados e novos funcionários chegam – até agora foram cerca de 60.
“Não estamos fazendo nada de espetacular. Estamos ajustando o PanAmericano à realidade do mercado”, diz Acar. É um trabalho que, segundo ele, ainda vai demandar cerca de seis meses daquilo que chama de “umbigo no balcão”.
Enquanto essa nova estrutura não estiver em pé, não se verá no PanAmericano um crescimento extraordinário no crédito. “Não aceleramos a produção até ter uma visão clara de onde estamos pisando”, explica Acar. O ritmo até desacelerou. De janeiro a março, a média de desembolso mensal em novos empréstimos era de R$ 575,5 milhões e, de abril a junho, foi de R$ 498,2 milhões.
O fato de a casa ainda estar sendo colocada em ordem, porém, não significa que o PanAmericano não tenha um plano de negócios traçado. O banco já sabe onde quer chegar. É claro que o peso do financiamento a veículos será reduzido. Esse tipo de empréstimo corresponde a quase 70% da carteira de crédito e deve corresponder a algo em torno de 50% e 55%.
Novas modalidades de crédito ganharão importância. Uma delas é o crédito pessoal. A ideia do PanAmericano é ocupar, com as 250 lojas de rua que tem, o espaço que os bancos deixaram para trás com o fechamento de redes como Losango, do HSBC e Fininvest, do antigo Unibanco. “Todo mundo saiu e abriu-se uma oportunidade. É possível desenvolver alguns produtos com taxas mais baixas do as que existiam”, afirma Acar. Refinanciamento de imóveis e de carros estão no radar do banco. A diversificação também passará pelo desenvolvimento de novos produtos para empresas com faturamento anual de até R$ 500 milhões, que ficarão com algo em torno de 10% a 12% da carteira ante o saldo “ridículo” de hoje. Mais uma vez, a avaliação de Acar é que os bancos deixaram um mercado desassistido.
A carteira de veículos continuará a ter peso importante para os negócios, mas não escapará de mudanças. Hoje focado no financiamento de carros usados de certa idade, o banco buscará elevar a fatia dos novos e semi-novos, que possuem um risco de crédito mais baixo. Para isso, o banco está contratando uma equipe de cerca de 250 pessoas que atuava nas revendedoras de carros para o banco HSBC, liderada por Sergio Antonio Cipovicci. Em julho, a instituição inglesa anunciou a saída do ramo de financiamento para não-clientes, o que o PanAmericano enxergou como uma oportunidade para acelerar seu crescimento. “Queimamos uma etapa importante. Se fôssemos crescer organicamente, demoraríamos mais”, diz Acar.
Além da mudança do mix de crédito, o PanAmericano busca reduzir o custo de captação. Em julho, o banco resgatou antecipadamente US$ 125 milhões em notas subordinadas com vencimento em 2016 por achar que estariam com um custo acima do condizente com o risco de crédito de um banco que passou a ter o controle dividido entre BTG Pactual e Caixa.
“A captação, que foi a zero depois da descoberta da existência de fraude em seu balanço, tem gradualmente voltado”, explica Acar. Mas ainda há espaço para a redução do custo de “funding”. Segundo ele, em relação ao custo do estoque atual, que carrega muitas operações fechadas com taxas até exorbitantes, seja possível uma redução acional de 15% a 20%.
Mas as principais fontes de recursos do banco ainda são os sócios BTG e Caixa, que fornecem liquidez sempre que necessário. O banco vem cedendo carteiras, quase sempre com ajuda dos sócios. No primeiro semestre deste ano, foram cerca de R$ 5 bilhões cedidos, sendo R$ 4,2 bilhões no primeiro trimestre, o que fez o banco ter lucro R$ 76,1 milhões. Desses, R$ 3,5 bilhões foram vendidos a um fundo de direitos creditórios com recursos do BTG, para limpar o balanço do banco. No segundo trimestre, o PanAmericano fez um primeiro teste de cessão para a Caixa, de R$ 700 milhões — a cessão é sem coobrigação. De abril a junho, quando a venda de créditos caiu, o PanAmericano teve prejuízo de R$ 25,5 milhões.
Um ponto que pode limitar o crescimento das operações do PanAmericano é o fato de o banco hoje estar com um índice de Basileia – que determina o nível de alavancagem das instituições – de 12,44%, bastante próximo do mínimo de 11% exigido pelo Banco Central. Acar já disse em entrevistas anteriores que o PanAmericano pode alcançar uma carteira de crédito entre R$ 30 bilhões e R$ 40 bilhões e não esconde que gostaria de poder reter mais operações em seu próprio balanço. Hoje, estão no balanço apenas R$ 4 bilhões, mas o número da carteira sobe a R$ 10 bilhões somando-se o que foi cedido a FIDCs da casa e a outros bancos. Ou seja, com as mudanças de contabilização de cessão de carteiras previstas para 2012, que prevê o retorno ao balanço de cessões com coobrigação, a alavancagem pode subir. Acar diz que o banco não prevê receber aumento de capital dos sócios – ele não comenta, mas a Caixa teria limitações financeiras e políticas para injetar recursos no banco agora. Sendo assim, o banco trabalha com a delicada equação de ampliar seu capital com a retenção de lucros no futuro. Mas, para isso, precisa crescer e crescer demanda capital.
Fonte: Vanessa Adachi e Carolina Mandl, Valor Economico