Réus do Banco Rural recorrem à Corte Interamericana
Quase um ano depois de serem presos, os três principais réus condenados no chamado “núcleo financeiro” do mensalão ingressaram ontem com um pedido inédito de soltura na Comissão Interamericana de Direitos Humanos, em Washington, e na Corte Interamericana, em San José da Costa Rica.
A defesa de Kátia Rabello, José Roberto Salgado e Vinícius Samarane, ex-dirigentes do Banco Rural, alega que eles estão presos ilegalmente, pois não têm foro privilegiado e foram julgados por instância única – o Supremo Tribunal Federal (STF) – sem direito a recurso.
Formalmente eles vão ingressar com medida cautelar junto à Comissão de Washington e à Corte de San José. A preocupação da defesa é que já se passaram cinco meses desde que eles ingressaram com petição em Washington, denunciando o Estado brasileiro pelo fato de os réus terem sido julgados em instância única, sem possibilidade de recurso, mas até agora não houve resposta. Nesse meio tempo Kátia cumpre pena na Penitenciária Estevão Pinto, em Belo Horizonte, enquanto Salgado e Samarane estão no Presídio Nelson Hungria, em Contagem (MG). Os dois primeiros foram condenados a 14 anos e cinco meses de prisão por lavagem de dinheiro, evasão de divisas e gestão fraudulenta de instituição financeira. O último pegou oito anos e nove meses por lavagem de dinheiro e gestão fraudulenta.
A Corte já concedeu cautelares para livrar da prisão pessoas que estavam no corredor da morte em outros países e questionaram a forma pela qual foram julgadas. Nesses casos o risco de não concessão da cautelar era a morte dos réus. Já a medida protocolada ontem não trata de risco de morte, mas sim de um caso descrito pelos advogados dos réus como “prisão ilegal” pelo fato de eles não terem tido o direito de recorrer a outro órgão julgador para contestar as condenações no mensalão. A medida é inédita, pois nunca a Corte e a Comissão Interamericana analisaram pedidos de soltura de pessoas condenadas pelo Supremo do Brasil.
A cautelar chega à Corte Interamericana 12 dias depois de o ministro Ricardo Lewandowski ter declarado, em sua posse na Presidência do STF, que é necessária maior interlocução com os tribunais supranacionais. Para o novo presidente do Supremo, é preciso “que os nossos magistrados tenham uma interlocução maior com os organismos internacionais, como a ONU e a OEA, por exemplo, especialmente com os tribunais supranacionais quanto à aplicação dos tratados de proteção dos direitos fundamentais, inclusive com a observância da jurisprudência dessas Cortes”.
Uma das razões da cautelar é o fato de as denúncias à Comissão demorarem em média cinco anos para tramitar. Como os réus do núcleo financeiro estão presos foi pedido tratamento prioritário à denúncia que foi proposta em abril, mas a expectativa é a de que o caso demore um pouco mais para ser analisado. Diante dessa previsão a defesa dos ex-dirigentes do Banco Rural optou por ingressar com um pedido urgente de soltura – a medida cautelar.
Caso o pedido seja aceito pela Comissão seria recomendada ao Ministério das Relações Exteriores do Brasil a soltura dos três réus. Já uma eventual aceitação da cautelar pela Corte Interamericana seria mais forte, pois determinaria ao Estado brasileiro a libertação de Kátia, Salgado e Samarane até a realização de um novo julgamento, o que deveria ser feito pelo próprio Supremo.
A diferença é que um eventual novo julgamento não teria mais a presença de Joaquim Barbosa, que se aposentou do STF, onde foi responsável pelos votos mais rigorosos determinando condenações no mensalão, e seria presidido por Lewandowski, que votou inicialmente pela absolvição e depois, na fase de embargos, pela redução das penas de vários condenados. Nesse cenário os réus teriam mais chance de conseguir uma decisão favorável.
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