PanAmericano apaga passado
Quem esperava ler o balanço do PanAmericano, divulgado às 23h58 do dia 15 de fevereiro, e entender de que forma as já famosas “inconsistências contábeis” afetaram as contas do banco ficou frustrado.
A nova administração decidiu ignorar o passado, o que significa que não foi feita nenhuma comparação com os demonstrativos apresentados anteriormente. A equipe comandada pelo ainda diretor superintendente do PanAmericano, Celso Antunes da Costa, que foi nomeada em 9 de novembro, optou por apresentar apenas o balanço de um único mês, referente a dezembro de 2010. “Não tinha como publicar algo que não faria nenhum sentido”, afirmou.
Para cumprir a exigência regulamentar da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), foi enviado um balanço referente ao terceiro trimestre, mas que não foi assinado pela atual direção do banco e supostamente ainda é produto das práticas contábeis heterodoxas que vinham sendo adotados pela antiga administração.
A Deloitte, criticada por não ter identificado o rombo divulgado em novembro, recusou-se a opinar sobre o documento, a opção mais extrema que têm os auditores diante de balanços problemáticos.
Assim, todos os ajustes que levaram o patrimônio líquido consolidado a cair para R$ 152 milhões em novembro – data de abertura do novo balanço – não foram detalhados. Em junho, antes da descoberta dos desfalques, o patrimônio era de R$ 1,37 bilhão.
A evidenciação sobre o rombo total de R$ 4,3 bilhões e como ele foi ou será coberto foi mostrada nas notas que acompanham o balanço, com números arredondados (ver detalhes das perdas na ilustração abaixo).
Uma das fontes de recursos para cobrir o buraco foi o primeiro aporte feito pelo acionista controlador Grupo Silvio Santos – com dinheiro do Fundo Garantidor de Crédito (FGC) -, no valor de R$ 2,5 bilhões. Desse total, R$ 2,3 bilhões ficaram na própria instituição e R$ 200 milhões foram repassados para a empresa de cartões do grupo. A diferença de R$ 2 bilhões foi coberta pelo novo aporte de R$ 1,3 bilhão e com R$ 700 milhões em ativação de crédito tributário.
Mas esse ajuste aparentemente perfeito não se reflete nos números do balanço patrimonial.
Isso porque o segundo aporte, no valor de R$ 1,3 bilhão, só foi feito em janeiro, depois do fechamento do balanço.
Na opinião do professor Eliseu Martins, ex-diretor da CVM, e de outro especialista em contabilidade que preferiu não se identificar, apesar da saída adotada pela nova administração do banco ser atípica, não havia muito o que fazer.
Assim como alegou o diretor superintendente do PanAmericano, eles dizem que se não há como identificar em que momento as perdas ocorreram, fica sem sentido apresentar o balanço sobre o período anterior. E se fosse tudo reconhecido no terceiro trimestre, essa informação poderia levar a conclusões erradas.
Para o professor Martins, no entanto, embora nenhuma norma exija isso, “ganharia-se muito em transparência” se houvesse uma demonstração detalhada da mutação do patrimônio líquido a partir do último número apresentado anteriormente.
Procurada para comentar sobre a forma de divulgação adotada pelo PanAmericano, a CVM disse que cabe ao Banco Central regular a publicação de balanços das instituições financeiras, mas que, no âmbito das suas atribuições, está “analisando e investigando os assuntos relacionados ao banco”, o que inclui, em linha com o disposto nas normas contábeis, “a avaliação da alegada impossibilidade de determinar o efeito acumulado dos erros identificados em data anterior a 30 de novembro”.
Ao apresentar os números da instituição na manhã de ontem em entrevista, Antunes da Costa, do PanAmericano, não quis comentar o acordo entre FGC e Silvio Santos, nem as investigações sobre a antiga administração.
Disse apenas que considera uma “obra de inteligência” o esquema montado e que ele teria sido arquitetado por “duas ou três pessoas”. Mesmo assim, a nova diretoria decidiu demitir 40 funcionários. Ou porque sabiam dos truques contábeis e não denunciaram ou porque deviam saber, pela posição ocupada.
Antunes da Costa afirmou ainda, durante a entrevista, que era impossível ter um balanço mais preciso que aquele que ele apresentava. Mais tarde, o banco informou sobre um ajuste de R$ 360 milhões ligado ao índice de Basileia, que precisou ser corrigido.
Fonte: Fernando Torres e Aline Lima, Valor Economico