Auditor do Panamericano falhou, diz BC
As investigações do Banco Central (BC) sobre o rombo bilionário do Panamericano apontaram falhas no trabalho da Deloitte, a empresa que auditava o banco. Documentos do BC, aos quais o ‘Estado’ teve acesso, afirmam que a Deloitte não teria adotado “procedimentos adequados e suficientes de auditoria que permitissem detectar grave irregularidade contábil praticada de forma sistemática e contínua” pelo Panamericano.
Em razão dessas supostas falhas, segundo os técnicos do BC, a Deloitte “emitiu parecer sem ressalvas referente às demonstrações financeiras de 30/06/2010”. Com isso, chancelou como real e confiável uma peça que depois se revelou fraudulenta – o BC descobriu que a contabilidade do Panamericano era maquiada e escondia perdas que chegaram a R$ 4,3 bilhões.
É preciso lembrar, porém, que o próprio BC não conseguiu detectar a fraude inteira. Os técnicos que descobriram o rombo inicial de R$ 2,5 bilhões no ano passado não perceberam que havia mais um buraco de R$ 1,3 bilhão – encontrado este ano pela nova administração do Panamericano, com ajuda da própria Deloitte. A empresa de auditoria nega todas as acusações do BC.
As suspeitas do BC provocaram a abertura de um processo administrativo interno para apurar a responsabilidade da Deloitte e do auditor responsável pelo Panamericano no episódio. Além disso, a instituição encaminhou seus relatórios ao Ministério Público Federal, à Polícia Federal e à Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Procurado, o BC não quis se manifestar.
Farsa
A principal farsa no Panamericano consistia em inflar o balanço com ativos que não existiam. O Panamericano emprestava muito a pessoas das classes C e D. Com esses empréstimos, montava grandes carteiras que depois eram vendidas a outros bancos, com desconto. Só que, mesmo vendidas, essas carteiras continuavam no balanço. O objetivo era fazer o público acreditar que o banco tinha créditos bons e em grande volume para receber.
Esse tipo de operação, tecnicamente chamada “cessão de crédito”, representava a segunda maior fonte de captação de recursos do banco e era a mais rentável das operações de crédito. Pela sua relevância, diz o BC, essas operações deveriam ter sido avaliadas com mais atenção.
Nos relatórios, o BC afirma que o auditor independente deve fazer a confirmação dos “valores das contas a receber e a pagar, por meio da comunicação direta com os terceiros envolvidos, quando o valor envolvido for expressivo em relação à posição patrimonial e financeira e ao resultado das operações”.
Mas, segundo o BC, “a Deloitte não executou o referido procedimento, uma vez que não enviou correspondências solicitando a confirmação detalhada de saldo aos cessionários (bancos) com os quais o Panamericano detinha responsabilidade significativa em relação ao total das coobrigações por cessão (operações)”.
De acordo com os relatórios do BC, em vez de procurar diretamente os bancos que compraram as carteiras do Panamericano, a empresa de auditoria pediu ao próprio Panamericano que mandasse cartas ao Bradesco e ao Itaú Unibanco pedindo informações. As respostas foram entregues diretamente à Deloitte, mas “não consta item específico acerca das coobrigações por cessão de crédito (as vendas de carteira)”.
Teste
A Deloitte ainda aplicou um teste alternativo, mas ele também “não contemplou o saldo das coobrigações por cessão de créditos”, afirma o relatório do BC. “Caso colocada em prática, essa técnica (a abordagem direta de quem fez negócio com o Panamericano) revelaria que a responsabilidade do Panamericano com o Sistema Financeiro Nacional seria significativamente superior àquela registrada pela instituição”, conclui o relatório do BC.
Fonte: David Friedlander e Fausto Macedo, de O Estado de S. Paulo
‘Fizemos tudo que era preciso’, afirma Deloitte
Com mais de 90 páginas de explicações, a defesa da Deloitte nega a acusação feita pelo Banco Central de não ter adotado procedimentos “adequados e suficientes” quando auditava o Panamericano. “Fizemos tudo que era preciso fazer”, afirma Maurício Pires Resende, sócio da Deloitte. Segundo ele, ao contrário do que diz o BC, o trabalho de auditoria foi focado nas operações de venda de carteiras de crédito para ouras instituições – principal fonte de irregularidades.
Segundo o BC, em vez de procurar diretamente os bancos que tinham comprado carteiras de empréstimo do Panamericano para conferir informações, a Deloitte pediu que à diretoria do Panamericano que fizesse o pedido. A Deloitte nega. “Enviamos cartas aos principais parceiros do Panamericano pedindo o saldo das transações que incluem cessão de crédito (venda de carteiras). Pedimos mais de uma vez e os bancos não responderam. Por isso, pedimos aos então diretores para nos ajudar”, diz Pires.
O auditor nega, também, que, diante da falta de resposta dos bancos, a Deloitte tenha deixado de fazer testes alternativos, como afirmam os relatórios do BC. “Revisamos controles internos, revisamos contratos do banco com outras instituições, confrontamos valores”, afirma. De acordo com a Deloitte, o rombo do Panamericano não foi detectado porque era fruto de fraude. “A fraude envolveu a administração anterior do banco e uma série de funcionários, com o objetivo de manipular e adulterar informações”, diz o auditor.
Fonte: David Friedlander e Fausto Macedo, de O Estado de S. Paulo