CVM fará ajuste no Formulário de Referência
Passado um ano da criação do Formulário de Referência, relatório anual de informações obrigatório para as companhias abertas, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) já tem suas primeiras impressões sobre a novidade e já pensa em fazer mudanças no documento, com destaque para a polêmica seção que trata dos salários dos executivos.
Principal fonte de informações sobre as empresas de capital aberto, o Formulário de Referência traz a descrição das atividades operacionais da companhia, sua estrutura de governança e de controle e políticas de gestão de risco e remuneração, entre outros dados e análises.
Segundo a presidente da CVM, Maria Helena Santana, é claro que o nível de informação já melhorou em relação ao que havia até 2009, mas as companhias ainda deixam a desejar quando se pede informações qualitativas dos administradores, como aquelas que constam da seção 10 do Formulário, em que os diretores devem fazer comentários sobre o desempenho da companhia nos últimos anos. “Muitos documentos ainda vêm só com relatos e não com avaliações”, afirma.
Ela destaca, entretanto, que a CVM não tem braços para analisar em detalhes todos os documentos e que, com apenas um ano, ainda não houve tempo suficiente para um diagnóstico completo sobre o Formulário.
A análise geral dos documentos é feita por amostragem, no âmbito do modelo de supervisão baseada em risco, em que são fiscalizados com mais rigor os relatórios das empresas com maior exposição ao mercado.
Além disso, são analisados com bastante cuidado os Formulários das companhias que entram com pedido de registro de oferta pública de ações ou de instrumentos de dívida.
“Na hora do prospecto, a empresa acaba tendo que fazer esse exercício (de avaliar o desempenho qualitativamente), porque o mercado exige. Os bancos líderes não deixam a informação sair tão pobre porque isso prejudica a venda”, diz Maria Helena.
Os casos mais complicados, como já ocorria antes, são os das empresas listadas há tempo e que não acessaram o mercado por meio de ofertas nos últimos anos – assim, não tiveram que preparar prospecto seguindo as normas da Instrução n 400, de 2003.
“Essas companhias tendem a ter mais falta de familiaridade com os requerimentos, o que é natural, mas não serve como justificativa”, diz a presidente da CVM, que afirma contar não apenas com a fiscalização da área técnica, mas com a ajuda do mercado para evitar que a instrução vire letra morta, como o antigo documento anual, o IAN.
Além de cuidar para que os requisitos atuais do Formulário de Referência sejam atendidos, a presidente do órgão regulador do mercado brasileiro diz que estão em estudo algumas mudanças práticas nos quadros do Formulário. Uma das seções que deve ser alterada é a 13, que trata da remuneração da administração.
Segundo Maria Helena, como essa é uma área sobre a qual não havia informação pública até o ano passado, surgiram dificuldades práticas no preenchimento de alguns quadros.
Um desses pontos, diz ela, se refere aos salários da diretoria que são pagos por outras empresas do grupo. Embora haja um item que requer esse tipo de informação, ele não tem o mesmo tipo de abertura. “Pode ser que a gente acabe fazendo algum ajuste, para tornar mais claro para o investidor toda a estrutura de remuneração”, afirma, acrescentando que essa revisão, se de fato ocorrer, será no fim deste ano, até que autarquia tenha certeza do que precisa ser ou não alterado.
Qualquer mudança, entretanto, deve passar por processo de audiência pública, uma vez que o Formulário de Referência é um anexo da Instrução n 480.
Quando decidiu criar o novo documento, a ideia da CVM era que ele servisse como uma espécie de prospecto permanente. Quando uma empresa já aberta quisesse realizar uma oferta subsequente, ela precisaria apenas acrescentar informações específicas daquela operação, o que geraria uma economia de tempo.
Segundo a advogada Camila Goldberg, sócia do Barbosa Mussnich & Aragão (BM&A), a realidade do mercado ainda não chegou nesse ponto, mas já é possível observar um avanço importante. “Para levantar um prospecto do zero, leva cerca de dois meses. Para atualizar um Formulário, estamos falando de duas a três semanas. Tem sim um ganho de tempo”, afirma.
De acordo com Camila, esse encurtamento de prazos das ofertas, também motivado pelo convênio pelo qual a Anbima faz uma análise prévia da documentação antes da CVM, pode ser observado melhor agora, com as operações de ações se intensificando. Com um prazo maior no passado, diz ela, muitas empresas acabavam perdendo janelas de oportunidade para realizar suas captações.
Em termos de cobrança, Camila diz que ela ainda é maior no momento da oferta que na entrega tradicional do Formulário, ao menos em 2010. “O sentimento que a gente tem é que neste segundo ano, até por conta da experiência que a CVM ganhou no ano passado, o rigor seja um pouco maior”, afirma.
Fonte: Fernando Torres, Valor Economico