BC impõe barreira à compra de instituições financeiras por fundos
As cifras bilionárias que os fundos de “private equity” possuem para investir em empresas no Brasil têm encontrado barreiras em um setor: o financeiro. Preocupado com a solidez do sistema, o Banco Central tem adotado uma postura bastante cautelosa na aprovação de compras de bancos e corretoras por fundos de private equity, o que tem barrado algumas operações.
Segundo o Valor apurou, no fim do ano passado, depois de dois anos à espera do sinal verde do Banco Central, a gestora de fundos de private equity Advent desistiu de adquirir o controle do braço financeiro da varejista gaúcha Quero-Quero. Reformulou o acordo com o ex-controlador, que permaneceu à frente do negócio financeiro. O fundo ficou com uma participação elevada nos lucros em cima dos produtos financeiros vendidos nas lojas de sua propriedade.
Nos últimos tempos, a autoridade tem recebido diversas consultas de fundos de private equity interessados no setor financeiro. Os gestores querem sondar a receptividade do BC a suas investidas. Neste momento, pelo menos duas operações estão sendo avaliadas. Uma delas é a aquisição de uma fatia minoritária da corretora XP Investimentos pelo fundo inglês Actis.
A entrada de um fundo de investimento em participações no banco BVA também é apreciada. Outra transação que pode cair no radar do governo, caso venha a ser concretizada, é a compra do Banco Geração pelos fundos da Tarpon.
Além disso, o banco Gerador também andou sendo sondado por alguns fundos estrangeiros, mas a operação não caminhou depois de investidores concluírem que havia risco de o negócio não passar pelo crivo do governo.
Os dirigentes do Banco Central têm deixado claro aos gestores que a instituição não é contrária à entrada pura e simples dos fundos porque a chegada de mais capital pode elevar a competitividade do setor, o que seria uma boa notícia. A autoridade afirma a interlocutores que não ficará alheia à liquidez do mercado internacional, que quer despejar recursos nos países emergentes, mas que isso não significa que qualquer capital será bem-vindo. Um indício de que a entrada dos private equities não é vetada em todos os casos é que em 2006 o governo deu o sinal verde para o fundo TPG Axion deter 45,3% da companhia hipotecária Brazilian Mortgages, do grupo Brazilian Finance & Real Estate.
A principal preocupação manifestada pelo BC é em relação à origem dos recursos. Fundos de private equity não possuem donos, apenas diversos cotistas que fazem um investimento financeiro. A pergunta que surge é: quem vai ser responsabilizado em um cenário de quebra de uma instituição? As regras do sistema financeiro no Brasil exigem que o controlador de uma instituição financeira responda pessoalmente com seus bens em caso de algum problema. Em muitos casos, quem detém a cota do private equity é um fundo de pensão, que paga benefícios a milhões de aposentados, por exemplo. Também há a preocupação em conhecer a idoneidade dos cotistas do fundo. Checa-se, por exemplo, se não há lavagem de dinheiro por parte dos investidores por trás da aplicação. Para o Banco Central, apesar de o gestor ser responsável pela administração dos investimentos, ele não poderia ser culpado por eventuais prejuízos, já que o dinheiro investido não é dele.
Diversos fatores entram na análise do Banco Central. O ponto que mais demanda atenção da autoridade são os casos que envolvem a compra de controle de instituições financeiras. Participações inferiores a 5% são as que menos requerem preocupação, tanto que diversos fundos compraram ações de instituições que fizeram ofertas iniciais de ações nos últimos anos. Ou seja, o grau de análise do governo será mais detalhado quanto maior for a fatia que o fundo tiver.
Outra variável que acentua a investigação do Banco Central é o tipo de instituição financeira que receberá o aporte dos fundos. Menores exigências, por exemplo, são feitas no caso de corretoras. No caso de bancos, que captam recursos de correntistas de varejo, a preocupação é maior. Isso já está implícito no volume de capital mínimo normalmente exigido para a constituição de cada uma dessas instituições. Uma corretora de câmbio demanda R$ 300 mil, enquanto um banco requer R$ 51 milhões.
Além disso, preocupa o Banco Central o fato de os fundos de private equity terem um período pré-determinado para realizar lucros por meio da venda de suas participações nas empresas. A presença deles em empresas é datada, sem o tradicional perfil mais perene das atuais instituições financeiras no Brasil, que são em geral controladas por famílias ou por instituições internacionais com tradição no setor bancário. Como ficará a instituição depois da saída dos investidores? Quem assumirá o banco depois? Essas são algumas incertezas que rondam esse tipo de operação.
Procurado pela reportagem, o Banco Central afirmou por meio de uma nota que “analisa os casos individualmente e leva em conta as particularidades de cada investidor”.
Em outros países, muitas vezes os fundos de private equity não encontram restrições por parte dos reguladores. No Uruguai, o Advent comprou o controle do Nuevo Banco Comercial, o maior banco comercial do país, em 2006.
Muito empolgados com o setor financeiro no Brasil, a saída que os fundos estão encontrando para botar o pé nessa área é adquirir serviços paralelos ou complementares aos prestados por instituições financeiras. É o caso das plataformas de negociações de ativos, como a Cetip, que tem como sócio o Advent, e a BM&FBovespa, com o General Atlantic. Recentemente, dois fundos de private equity também demonstraram interesse pela companhia de securitização imobiliária Cibrasec.
Fonte: Carolina Mandl, Valor Economico