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A fábrica de dinheiro do Banco Cruzeiro do Sul

A cantora Barbra Streisand planejava fazer seu primeiro show no Brasil neste ano. Seus empresários negociavam com os donos do banco Cruzeiro do Sul a realização de duas apresentações, restritas a convidados da instituição, no Rio de Janeiro e em São Paulo.

Luis Octavio Índio da Costa e seu pai, Luis Felippe, os controladores do banco, queriam repetir o sucesso dos shows do britânico Elton John. Em 2009, quando o banco completou 15 anos, ele cantou e tocou piano para cerca de 1 000 convidados, primeiro no Anhembi, em São Paulo, depois na Sapucaí, no Rio.

Para azar de Barbra Streisand e seus fãs, os Índio da Costa deixaram de tomar decisões pelo Cruzeiro do Sul no dia 4 de junho, quando o Banco Central interveio na instituição, que estava prestes a quebrar, bloqueou os bens dos dois e de outros 13 executivos e colocou novos administradores para tocar a operação.

Passados três meses da intervenção, começam a aparecer os detalhes de um esquema que drenou bilhões de reais do banco ao longo de quase seis anos. EXAME ouviu 23 pessoas ligadas ao caso — entre advogados, auditores, clientes, executivos e ex-executivos do Cruzeiro do Sul — e reuniu documentos sobre o caso que apontam que houve uma combinação de irregularidades na instituição: empréstimos falsos, erros no balanço e fundos de investimento que burlavam as regras de mercado.

A Polícia Federal já abriu três inquéritos sobre o caso. Além das fraudes, os policiais investigam se houve desvio de recursos e sonegação de impostos.

Já é possível saber como funcionava aquilo que dois ex-diretores do banco apelidaram de “fábrica” de dinheiro. O que movia a fábrica, segundo nove pessoas que acompanham a nova administração, era a realização de empréstimos fictícios. O Cruzeiro  do Sul tinha 499 contratos para conceder crédito consignado a funcionários de prefeituras, governos estaduais e a membros de associações de classe em diferentes estados. Até aí, tudo legal.

O problema começou quando o banco decidiu usar o nome e o CPF de seus clientes para simular empréstimos. Todo empréstimo tem de ser atribuído a um gerente ou correspondente bancário. No caso do Cruzeiro do Sul, parte desses empréstimos fictícios era atribuída a uma desconhecida Brigada Promotora de Créditos e Vendas, que é acionista do próprio banco.

Sabe-se também que ao menos três entidades — entre elas a carioca Associação Beneficente dos Músicos Militares do Brasil (Ambra) — foram usadas pelo banco no esquema, como beneficiárias dos empréstimos falsos.

Os inquéritos da PF vão apurar se Ambra e Brigada estavam envolvidas na fraude ou se foram enganadas (procurada, a Ambra disse desconhecer o uso irregular de dados de seus associados; a direção da Brigada não foi encontrada até o fechamento desta edição). Ao todo, o Fundo Garantidor de Créditos, que hoje administra o banco, estima que tenham sido feitos cerca de 300 000 empréstimos falsos durante quase seis anos.

Como esse esquema ficou fora do radar do Banco Central? A partir de janeiro de 2011, quando detectou que o banco não estava informando corretamente suas perdas com devedores inadimplentes, o BC passou nove meses fiscalizando detidamente a instituição.

Exigiu que fossem feitos ajustes nos balanços, e só. Por que o BC nem desconfiou que havia milhares de créditos falsos ali? Isso começa a ficar claro agora. Segundo EXAME apurou,  quase todos os empréstimos irregulares eram inferiores a 5 000 reais e, até o ano passado, o BC só analisava operações de crédito superiores a esse valor. Isso mesmo: foram cerca de  300 000 empréstimos propositalmente pequenos.

A regra de fiscalização mudou em 2011, depois de descoberta a fraude no banco PanAmericano, e passou a valer em janeiro deste ano — agora, operações superiores a 1 000 reais são analisadas. O BC voltou a se debruçar sobre os números do Cruzeiro em janeiro e, aí, os problemas começaram a aparecer a rodo.

Quando esses empréstimos falsos eram excluídos do balanço, o patrimônio do Cruzeiro do Sul passava a ser negativo. O banco, portanto, estava quebrado.

No início de maio, Luis Octavio Índio da Costa recebeu uma notificação do BC que dizia que o banco precisava de capital. No fim do mês, começou a negociar a venda da instituição para o banco BTG Pactual e a pleitear uma ajuda do FGC para acertar as contas — como havia ocorrido com o PanAmericano, que foi socorrido pelo fundo em 2010, em meio a acusações de fraude, e comprado pelo BTG.

Desta vez, porém, não houve acordo. O BC interveio e o FGC passou a administrar a instituição. Procurados, os Índio da Costa e o BC não concederam entrevista.

Onde está o dinheiro

Hoje, o maior desafio dos investigadores é descobrir onde foi parar o dinheiro dos empréstimos falsos. É possível que parte dos recursos tenha sido desviada para outras empresas dos controladores do Cruzeiro. Outra possibilidade é que a fraude tenha sido feita só para inflar os resultados — e, assim, aumentar a distribuição de dividendos.

O Cruzeiro do Sul é o banco médio de capital aberto que mais distribuiu proventos (dividendos e juros sobre capital próprio) aos acionistas nos últimos quatro anos — um percentual de 67% do lucro ou 367 milhões de reais. Desse total, 294 milhões de reais foram para o bolso dos Índio da Costa.

A família era conhecida pelo estilo esbanjador. Em 2009, trouxe ao Brasil o cantor americano Tony Bennett, que fez uma única apresentação, no jardim de 6 000 metros quadrados da mansão de Luis Octavio em Cotia, a 35 quilômetros de São Paulo.

Outra acusação pesa sobre os donos do Cruzeiro e os executivos que comandavam sua gestora de recursos, a Verax: a de que ludibriavam seus clientes para desviar recursos para uma empresa da família Índio da Costa. Como isso acontecia?

O Cruzeiro do Sul vendia, como se fosse um Certificado de Depósito Bancário (CDB), um fundo de investimento em participações — uma modalidade de investimento muito mais arriscada que os CDBs. Documentos obtidos por EXAME mostram que clientes que entraram em contato com o banco para investir em CDBs foram direcionados para o Fundo de Investimento em Participações (FIP) BCSul Verax 5 Platinum.

Os gerentes diziam que o fundo tinha liquidez diária e uma rentabilidade fixa de 110% dos juros de mercado (CDI). Tudo isso é vetado pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Como os FIPs são aplicações de alto risco e prazo longo, a Comissão de Valores Mobiliários proíbe que se faça previsão de retorno ou que se ofereça liquidez diária.

Além disso, o FIP só fazia um tipo de aplicação: comprava títulos de dívida da Maragato, empresa de investimento que tem participações em shop­pings e companhias de logística e é, surpresa!, controlada por Luis Octavio e Luis Felippe. No fim de agosto, os cotistas do fundo — entre eles a faculdade Santa Marcelina, o Instituto das Irmãs Beneditinas, funcionários do banco e dezenas de investidores individuais — conseguiram uma liminar na 37ª Vara Cível de São Paulo para ter acesso a todos os dados da Maragato.

O objetivo  é entender para onde ia o dinheiro que eles colocavam no fundo. Em setembro, entraram com uma ação contra o Cruzeiro do Sul e a Verax. A CVM começou a analisar o fundo em 2010, depois de receber uma denúncia de um investidor — mas, até hoje, não houve desfecho. (Procurada, a Verax não comentou o caso.)

Em meio a tudo isso, Luis Octavio e seu pai precisam se defender de outra acusação: a de que estão envolvidos na fraude do banco Santos, que quebrou em 2004. Um relatório do BC obtido por EXAME mostra que uma empresa deles no Uruguai recebeu 149 milhões de reais entre dezembro de 2003 e janeiro de 2004 de empresas ligadas ao Santos.

O dinheiro foi transferido para contas dos Índio da Costa nos Estados Unidos e, segundo o BC, usado para comprar títulos de crédito da Alsace, empresa de Edemar Cid Ferreira, ex-dono do Santos (a EXAME,­ Edemar disse que nem conhece os banqueiros). Luis Octavio tem dito a amigos que as acusações são falsas.

Ele contratou o advogado criminalista Roberto Podval para preparar sua defesa e um auditor para fazer um relatório próprio. Para ele, a empresa de auditoria PricewaterhouseCoopers, contratada pelo FGC para vasculhar os balanços após a intervenção, errou ao dizer que existe um rombo de 3,1 bilhões de reais no banco.

O executivo diz que a KPMG, que auditou os balanços de 2006 a 2011, não encontrou problemas (a KPMG disse, em nota, que “está cooperando com os órgãos reguladores para prestar esclarecimentos”).

Até o fechamento desta edição, o FGC esperava propostas de interessados em comprar o Cruzeiro do Sul. Um leilão foi marcado para 7 de setembro, mas não houve lances. A data limite para as propostas mudou, então, para 12 de setembro.

Também nesta data, os credores do banco deveriam decidir se aceitavam o desconto proposto pelo FGC. Caso o FGC não encontre um comprador, o Cruzeiro do Sul será liquidado. Com reportagem de Daniel Barros

Fonte: Maria Luiza Filgueiras e Thiago Bronzatto, de 

marcos

Professor, Embaixador e Comendador MSc. Marcos Assi, CCO, CRISC, ISFS – Sócio-Diretor da MASSI Consultoria e Treinamento Ltda – especializada em Governança Corporativa, Compliance, Gestão de Riscos, Controles Internos, Mapeamento de processos, Segurança da Informação e Auditoria Interna. Empresa especializada no atendimento de Cooperativas de Crédito e habilitado pelo SESCOOP no Brasil todo para consultoria e Treinamento. Mestre em Ciências Contábeis e Atuariais pela PUC-SP, Bacharel em Ciências Contábeis pela FMU, com Pós-Graduação em Auditoria Interna e Perícia pela FECAP, Certified Compliance Officer – CCO pelo GAFM, Certified in Risk and Information Systems Control – CRISC pelo ISACA e Information Security Foundation – ISFS pelo EXIN.