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SEC inventa fraude sem fraudadores para livrar a cara da GE

imagesCAJ0U9O6Aqui temos outra lição desencorajadora para qualquer um esperando que as pessoas responsáveis pela crise financeira sejam levadas à Justiça algum dia. Só porque a Securities and Exchange Commission (SEC, a Comissão de Valores Mobiliários dos Estados Unidos) acusou uma das empresas “grandes demais para quebrar” de ter cometido uma fraude escandalosa não significa que a agência responsabilizará alguém por isso.

Imaginem só: uma fraude sem fraudadores. Se quisermos acreditar na SEC, foi exatamente isso o que aconteceu na General Electric (GE).

Passaram-se 18 meses desde que a GE pagou multa de US$ 50 milhões para encerrar as acusações na SEC de que teria recorrido a uma fraude contábil para não descumprir as projeções de lucro dos analistas de Wall Street, em 2002 e 2003. Quando o acordo foi revelado, a SEC informou ter encerrado sua investigação sobre a GE, que não admitia nem negava as acusações da agência.

A SEC, no entanto, deixou aberta a possibilidade para processar uma ou mais pessoas pela suposta fraude em alguma data posterior. Não se ouviu mais nenhuma palavra da SEC sobre o caso desde que arquivou o acordo sobre o caso, em agosto de 2009.

Agora, podemos dizer como a história termina. Um porta-voz da SEC, John Nester, me disse que a investigação acabou no segundo trimestre de 2010. A SEC não processará nenhuma pessoa física como resultado de sua investigação. Nester não quis prestar mais comentários.

Mesmo com todas as vezes em que a SEC foi criticada por ser suave demais contra as fraudes empresariais, o acordo com a GE se diferencia. Para entender por quê, é preciso escavar os detalhes das acusações da SEC contra a companhia.

A SEC acusou a GE de cometer fraude com conhecimento ou intenção de irregularidade, em violação do artigo 10 (b) da Lei de Bolsas de Valores Mobiliários, de 1934. No arsenal da SEC, não há acusação mais grave. Ainda assim, de alguma forma, a SEC não conseguiu apontar uma única pessoa que tenha violado qualquer regra, muito menos cometido fraude deliberadamente.

O caso agora é uma memória tão distante que Jeffrey Immelt, executivo-chefe da GE desde 2001, foi indicado em fevereiro como presidente do Conselho de Empregos e Competitividade, de Barack Obama.

Anne Eisele, porta-voz da GE, não quis comentar o assunto.

Podemos apenas tentar adivinhar por que a SEC decidiu não processar ninguém no caso. Talvez as evidências fossem fracas e a GE tenha pagado o equivalente a um “greenmail” [pagamento antiaquisição, ágio que as empresas pagam pelas ações em mãos de possíveis compradores indesejados] para afastar a SEC.

Talvez os alvos iniciais da SEC tenham ameaçado contestar a acusação até o fim dos tempos caso fossem processados, drenando assim os recursos limitados da agência. Ou talvez os advogados da SEC tenham decidido perdoá-los por algum motivo nobre.

Não sabemos e provavelmente nunca saberemos. Pena que o juiz federal de primeira instância que aprovou o acordo, Robert Chatigny, de Hartford, Connecticut, o aprovou sem fazer perguntas a nenhuma das duas partes.

Outra possível explicação: talvez a SEC tenha raciocinado que um grupo de pessoas, coletivamente, tinha informações suficientes para saber que as contas estavam erradas, mas que nenhuma pessoa, individualmente, sabia de tudo. Nos círculos judiciais essa teoria às vezes é chamada de dolo coletivo. Em outras palavras, em uma acusação civil contra uma empresa, o conhecimento de um ou mais funcionários é combinado com uma adulteração de outro funcionário para estabelecer o dolo, mesmo com nenhum deles tendo agido com dolo individualmente.

O problema com essa teoria é que a maioria dos tribunais federais de apelação a rejeita, segundo um artigo de 2009 de Bradley Bondi, da New York University, que foi publicado quando ele era assessor do comissário da SEC, Troy Paredes, um dos dois republicanos da comissão. Certamente, todas as decisões judiciais na área de dolo coletivo envolvem litígio de valores mobiliários entre agentes privados. Portanto, continua sem resposta a questão se a SEC pode usar essa teoria, escreveu Bondi. No artigo, Bondi, agora sócio da banca de advocacia Cadwalader Wickersham & Taft, em Washington, pediu à SEC para evitar essa abordagem.

Foi assim que o tribunal de apelações do segundo circuito descreveu a tradicional caracterização de responsabilidade empresarial num processo envolvendo fraude com ativos financeiros: “Para comprovar a culpa de uma companhia”, escreveu o tribunal numa decisão no ano de 2008, “o reclamante deve provar que um agente da empresa cometeu um ato culposo com a intencionalidade necessária e que o ato (e o correspondente estado mental) é imputável à empresa”.

O tribunal onde a SEC entrou com sua denúncia contra a GE faz parte do segundo circuito. Pela lógica da decisão do tribunal de apelações em 2008, a SEC somente poderia ter provado que a GE agiu com intencionalidade se comprovasse que um de seus funcionários também agiu intencionalmente. Agora sabemos que a SEC desistiu de tentar levar essa acusação adiante.

Em vista disso tudo, aqui vão as razões pelas quais o caso envolvendo a GE me preocuparia se eu fosse principal assessor jurídico de uma empresa de capital aberto. Mesmo que a SEC não tivesse nenhuma evidência de que quaisquer dos funcionários de minha empresa tenham cometido uma violação do artigo 10 (b) da lei, seus advogados ainda poderiam tentar encadear uma série de fatos difusos para fazer parecer que a empresa havia deliberadamente cometido uma fraude, com a esperança de pressioná-la a aceitar um acordo que resultaria num espalhafatoso comunicado à imprensa.

O recado aos investidores é igualmente preocupante. Não faz sentido que a GE possa ter defraudado seus acionistas, a não ser que alguma pessoa tenha cometido as mesmas violações. Assim, se os malfeitores saíram ilesos, a SEC não deveria ter movido a ação contra a empresa. Isso não é aplicação da lei. É uma farsa.

As opiniões expressas neste artigo são pessoais e de inteira responsabilidade do autor.

Fonte: Jonathan Weil é colunista da Bloomberg, Valor Economico.

marcos

Professor, Embaixador e Comendador MSc. Marcos Assi, CCO, CRISC, ISFS – Sócio-Diretor da MASSI Consultoria e Treinamento Ltda – especializada em Governança Corporativa, Compliance, Gestão de Riscos, Controles Internos, Mapeamento de processos, Segurança da Informação e Auditoria Interna. Empresa especializada no atendimento de Cooperativas de Crédito e habilitado pelo SESCOOP no Brasil todo para consultoria e Treinamento. Mestre em Ciências Contábeis e Atuariais pela PUC-SP, Bacharel em Ciências Contábeis pela FMU, com Pós-Graduação em Auditoria Interna e Perícia pela FECAP, Certified Compliance Officer – CCO pelo GAFM, Certified in Risk and Information Systems Control – CRISC pelo ISACA e Information Security Foundation – ISFS pelo EXIN.