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Governança Corporativa: Empresas fogem do conflito

Conflito de interesse nas empresas de capital aberto ainda é um tabu. A maioria delas simplesmente não desenvolveu – ou pelo menos não informou aos acionistas de maneira clara – quais são as regras para lidar com uma situação que é evidente no mercado brasileiro, em que as empresas têm predominantemente controle definido.

Na tentativa de fomentar essa discussão e aumentar a transparência entre as empresas e seus acionistas, em um dos itens que compõem o Formulário de Referência – relatório que deve ser entregue anualmente pelas empresas de capital aberto – a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) pede que elas descrevam, quando existirem, as políticas adotadas para identificar e administrar situações em que algum acionista possa ser beneficiado de modo particular ou quando há interesse conflitante com o da companhia, tanto nas deliberações que envolvam o conselho quanto nas assembleias gerais.

Entre 31 empresas listadas no Ibovespa e que integram o Novo Mercado, apenas uma – a empresa de concessões rodoviárias CCR – apresentou com clareza suas práticas no caso de conflitos de interesse em assembleias. Praticamente todas as outras (94%) simplesmente mencionaram ou transcreveram dispositivos da legislação referentes ao tema.

Quando se trata das práticas para identificar e administrar conflitos de interesses dentro do conselho de administração, só cinco apresentaram regras: BM&FBovespa, Banco do Brasil, CPFL, Embraer e CCR. Do total, 19% admitiram não ter normas para lidar com a situação.

Os números fazem parte de um estudo conduzido pela professora Roberta Nioac Prado e pela pesquisadora Angela Donaggio, ambas da Direito GV. Elas analisaram os Formulários de Referência entregues até o fim do ano passado por ALL, B2W, BM&FBovespa, Banco do Brasil, BRF, Cosan, CPFL, Vanguarda (ex-Brasil Ecodiesel), Embraer, JBS, LLX, Lojas Renner, Marfrig, MMX, MRV, Natura, OGX, PortX, Sabesp, Cielo, Duratex, Brookfield, Cyrela Realty, Fibria, Gafisa, Hypermarcas, Light, PDG Realty, Redecard e Rossi Residencial.

Entre as empresas que não descreveram suas práticas para lidar com o tema, o que se vê é uma cópia de artigos da legislação societária, que estabelece que o acionista não pode votar nas deliberações que puderem beneficiá-lo de modo particular ou quando haja interesse conflitante com o da companhia. Durante muito tempo houve duas leituras possíveis da lei. Uma corrente defendia que o sócio fosse impedido de participar da assembleia e outra, que o caso fosse analisado após a votação, com a eventual anulação da operação ou afastamento do indivíduo. Entretanto, em 2010, uma marcante decisão da CVM envolvendo a Tractebel, deixou claro o entendimento da autarquia de que o acionista fica impedido de votar numa situação de conflito.

“O que pede a CVM no Formulário de Referência é diferente, são as práticas, é a conduta, é uma discussão profunda que vem antes disso”, explica Angela. Por isso, ela acredita que as empresas que apenas citaram a legislação societária não atenderam à solicitação feita pela autarquia no formulário.

Além disso, algumas empresas mencionaram que eventuais situações conflitantes serão destinadas à Câmara de Arbitragem da BM&FBovespa, mas este já é um pré-requisito para as companhias que aderem ao Novo Mercado.

Para a CVM, o fato de tantas empresas terem optado, ao preencher o Formulário de Referência, pela mera transcrição das regras de conduta previstas na lei pode refletir o atual estágio dessa discussão dentro das companhias. Questionada se pretende ser mais rigorosa com essas empresas no futuro, a autarquia não respondeu.

Quando adotou o formulário, a CVM deixou claro que ter políticas não era obrigatório. O importante era que a empresa pensasse sobre o tema e deixasse o investidor informado. Assumir que não possui uma política também é uma informação relevante.

Para Angela, o fato de a CCR ter sido a única a expor suas práticas para identificar e administrar situações de conflitos de interesse é que, sem essas normas claras, a empresa de concessões não funcionaria. Isso porque os principais acionistas do bloco de controle – Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa e Soares Penido – são concorrentes do setor. “Se as normas não estivessem super definidas ela não andaria. Seria uma constante briga entre gigantes”, prevê.

Em seu Formulário de Referência, a CCR caracteriza como conflito de interesse a situação em que uma assembleia geral ou reunião do conselho de administração tem por objetivo deliberar a respeito de contratos entre a companhia e a controladora ou empresas pertencentes ao grupo e os termos e condições não sejam considerados justos de acordo com as práticas de mercado.

A empresa estabelece, em seu acordo de acionistas, que os controladores devem se abster de votar nas reuniões prévias e fazer com que os membros indicados por cada um para compor o conselho de administração não votem em suas reuniões nesses casos.

A empresa diz que não teve dificuldade para preencher os itens referentes a conflitos de interesse no Formulário de Referência. “O fato de os fundadores serem competidores entre si no setor de concessões levou a uma situação em que o aspecto da governança foi fundamentalmente pensado ainda antes de a companhia ser criada”, diz Arthur Piotto Filho, diretor financeiro e de relações com investidores da CCR, primeira empresa a integrar o Novo Mercado.

Para a CPFL Energia, uma das empresas que expôs claramente como lida com conflitos nas assembleias, falar sobre o tema não foi novidade. Desde 2005, a companhia tem ADRs negociados na Bolsa de Nova York e, por isso, já tem o hábito de preencher o Formulário 20F. “O Formulário de Referência é praticamente uma tradução do 20F, então já estávamos acostumados. Lá nos Estados Unidos eles são muito rigorosos, não dá pra colocar ‘meia informação’ porque volta”, explica a assessora do conselho de administração da companhia, Gisélia da Silva. “Pela própria estrutura acionária da empresa, que tem bloco de controle, a gente precisa ter regras claras para mostrar ao mercado.”

No caso de transações envolvendo partes relacionadas, a empresa do setor de energia conta com um comitê com o objetivo de assessorar na avaliação do processo de seleção de fornecedores e prestadores de serviços, aquisição de insumos e de contratos acima de determinado valor.

Para Angela, a BM&FBovespa é a companhia em que a discussão sobre conflito de interesses parece estar mais evoluída. Além de pontuar suas práticas para lidar com o tema, a bolsa foi a única que estabeleceu consequências para aqueles de descumprirem a regra.

Conforme descrito no Formulário de Referência, caso um conselheiro que possa obter ganho privado decorrente de uma decisão não manifeste seu conflito de interesses, essa atitude será reportada ao comitê de governança e estará sujeita a uma ação corretiva a ser definida.

Fonte: Ana Luisa Westphalen, Valor Economico

marcos

Professor, Embaixador e Comendador MSc. Marcos Assi, CCO, CRISC, ISFS – Sócio-Diretor da MASSI Consultoria e Treinamento Ltda – especializada em Governança Corporativa, Compliance, Gestão de Riscos, Controles Internos, Mapeamento de processos, Segurança da Informação e Auditoria Interna. Empresa especializada no atendimento de Cooperativas de Crédito e habilitado pelo SESCOOP no Brasil todo para consultoria e Treinamento. Mestre em Ciências Contábeis e Atuariais pela PUC-SP, Bacharel em Ciências Contábeis pela FMU, com Pós-Graduação em Auditoria Interna e Perícia pela FECAP, Certified Compliance Officer – CCO pelo GAFM, Certified in Risk and Information Systems Control – CRISC pelo ISACA e Information Security Foundation – ISFS pelo EXIN.