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Com Basileia 3, Société Générale precisa dobrar capital até 2013

GovernançaFrédéric Oudéa era diretor financeiro do banco Société Générale quando, em janeiro de 2008, um dos maiores escândalos do mundo das instituições financeiras veio à tona: o operador Jérôme Kerviel causou perdas de € 4,9 bilhões ao banco com transações não autorizadas. Condenado à prisão em 2010, Kerviel “ficou no passado” para Oudéa, hoje principal executivo e presidente do conselho do segundo maior banco em valor de mercado da França. “O que está tomando meu tempo hoje é encontrar formas de gerenciar os riscos de capital, de liquidez, de mercado e de crédito em meio às inúmeras novas regulações”, diz.

Segundo ele, as novas regras previstas no acordo de Basileia 3 “estão realmente mudando o cenário” para o sistema financeiro internacional. Ele calcula que até 2013 o Société Générale vai precisar dobrar seu capital em relação ao que tinha em 2007, antes da grave crise de crédito que balançou o sistema financeiro internacional, mantendo os mesmos ativos. Além disso, diz ele, os reguladores estão pensando em pedir mais capital para as grandes empresas financeiras que ofereçam maior sistêmico maior. “Pensando do ponto de vista estratégico, antes da crise era bom ser grande, mas, depois da crise, com esse tipo de regulação, ser grande pode ser inconveniente”, continuou.

Em sua primeira visita ao Brasil, o executivo deixou claro que o foco do banco é no atacado – isso apesar de o banco ter comprado o Banco Cacique, especializado em crédito consignado e crédito direto ao consumidor, em fevereiro de 2007 por R$ 850 milhões à vista. Na época, o Société Générale tinha planos inclusive de entrar no financiamento imobiliário para as pessoas físicas. Hoje, com novo CEO e chairman, as prioridades claramente são outras.

Segundo o executivo, o Brasil já conquistou a confiança dos investidores do mundo todo. “Depois de dez anos de melhoria das condições macroeconômicas, os desafios para o país são de execução suficientemente rápida de todos os projetos, de conseguir cumprir os prazos, de gastar eficientemente”, afirmou, em entrevista exclusiva ao Valor, na sede do banco, no Rio.

“A fraude [cometida por Jérôme Kerviel e revelada em 2008] não aconteceria no Société Générale de hoje”

Valor: Qual a razão de o senhor visitar o Brasil neste momento?

Frédéric Oudéa : O Brasil é visto pelos nossos clientes, de Paris, como uma grande oportunidade de crescimento. Nós temos boas operações no Brasil. Eu passei três dias para me encontrar com nossos clientes, com as autoridades locais e com o presidente do Banco Central, para entender como o ambiente no setor bancário vai se desenvolver, encontrar com os funcionários do banco e responder suas questões. E estou muito satisfeito com o que vi. Vou voltar com uma visão muito precisa do potencial de crescimento do Brasil.

Valor: O senhor realmente vê potencial de crescimento?

Oudéa : Sim. Viajo muito para diferentes países no mundo e o Brasil combinas alguns dos elementos-chave estruturais que criam crescimento: uma população grande e crescente. Como você sabe, o crescimento é profundamente relacionado com a demografia. Segundo, o benefício de ter commodities como recursos naturais, em particular no setor de energia. Além disso, a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos vão ajudar o país a preencher as lacunas de infraestrutura. Depois de dez anos exemplares na melhoria das condições macroeconômicas que mudaram o status do Brasil, os desafios para o país são de execução suficientemente rápida de todos os projetos, conseguir cumprir os prazos, de gastar eficientemente. Hoje você pode ver o apetite dos investidores internacionais para investir neste país. Isso é muito óbvio.

Valor: Quais os planos para o banco no Brasil?

Oudéa : O país tem um mercado bancário muito consolidado e eficiente se você comparar com muitos países no mundo. Você tem bancos domésticos muito fortes. Nós não podemos entrar no mercado de varejo. Não há oportunidades de aquisição. Precisamos focar nas atividades nas quais nós podemos trazer valor. Percebi que as prioridades dos bancos locais ainda são relativamente domésticas. O que nós podemos trazer como um banco internacional é uma experiência setorial. Mineração é um setor global, commodities são um setor global, energia é altamente internacional. E esses são setores fundamentais nos quais nós conseguimos ser líderes mundiais. Eu vejo as empresas brasileiras com muitos projetos domésticos, mas também com planos internacionais.

Valor: A atuação de vocês será no atacado?

Oudéa : Sim. É fascinante calcular a quantidade de dinheiro que será necessária daqui para frente para o Brasil realizar todos os seus projetos. É claro que o mercado local vai gerar parte desse dinheiro, mas estou convencido de que teremos também uma necessidade de investidores internacionais. E um de nossos papéis é ajudar as empresas brasileiras a achar esse dinheiro que vem de fora. É algo que já estamos fazendo, por exemplo, com emissão de bônus no mercado de euros. Temos uma plataforma em dólares. Assim como o desenvolvimento de produtos derivativos de algumas companhias que têm estratégias de hedging. Isso é onde podemos adicionar valor. Além disso, estamos desenvolvendo produtos em sinergias. Por exemplo, gestão de frota de veículos ou leasing. Em leasing, somos líderes também em programas de vendor. Dessa forma, nós temos muito contato com grandes fornecedores de equipamentos de manufatura.

Valor: Os senhores planejam comprar outros bancos como o Cacique? Sabemos que o Banco Central está oferecendo alguns bancos aos investidores. Fizeram alguma proposta de compra aos srs.?

Oudéa : Eu não vão comentar isso… [risos] Nós temos uma plataforma grande com o Cacique. Temos a capacidade de crescer sem fazer uma aquisição. Eu diria que nossa prioridade para os próximos trimestres será o crescimento orgânico.

Valor: O senhor planeja trazer mais capital ao Brasil?

Oudéa : A questão depende da forma como o regulador vai adaptar as regras de Basileia 3 no país. Nós traremos mais capital, se necessário, mas acho que hoje temos um nível adequado de capital no país. Basileia 3 está realmente mudando o cenário do sistema financeiro internacional. Requer mais capital e, se compararmos a metade de 2007, antes da crise, e o final de 2013, Basileia 3 vai requerer de um banco como o Société Générale dobrar o capital que é necessário para o mesmo nível de ativos. É algo significativo. Há uma discussão que é muito importante para a comunidade financeira que diz respeito às instituições que têm risco sistêmico. Os reguladores estão pensando em pedir ainda mais capital para essas companhias. Pensando do ponto de vista estratégico, antes da crise era bom ser grande, mas, depois da crise, com esse tipo de regulação, ser grande pode ser inconveniente.

Valor: Que outras lições foram aprendidas com a crise?

Oudéa : A falta de liquidez foi uma das grandes questões dessa crise. Os bancos que faliram acabaram quebrando mais por questões de liquidez do que de capital. Os reguladores estão desenhando novas regras para as questões de liquidez. Antes, os reguladores estavam apenas focando em capital e o que estão pedindo cada vez mais é que os bancos estejam prontos para resistir a crises de liquidez. Isso significa que, se um banco faz empréstimos de longo prazo, não pode se financiar com recursos de curto prazo.

Valor: Como alongar o prazo das captações dos bancos?

Oudéa : Desenvolvendo um mercado de títulos no qual você pode emitir papéis de longo prazo, mas criando produtos de poupança que podem se beneficiar de incentivos fiscais.

Valor: O caso Jérôme Kerviel ainda pesa sobre o banco?

Oudéa : A fraude aconteceu há três anos e meio. De minha perspectiva, é um evento menor se comparado à crise de 2008, que está realmente mudando o mundo das finanças. Nós aprendemos as lições relativas a essa fraude, melhoramos os controles internos, mudamos nossas operações de suporte. Uma fraude como essa não aconteceria no Société Générale de hoje. O que está realmente tomando meu tempo hoje é como gerenciar os riscos de capital, de liquidez, de mercado e de crédito em meio às novas regulações. Kerviel já ficou no passado.

Valor: Qual o impacto da crise de dívida soberana de países da Europa no Société Générale?

Oudéa : O problema é como a Europa está sendo vista no resto do mundo e o impacto no preço das ações do banco. As pessoas estão preocupadas e não distinguem um banco do outro. Nós somos o maior banco [em termos de presença] na França, que é um país que vai muito bem, e, na Europa, só temos mais uma pequena operação de varejo, que é na Grécia. Temos presença na Europa do Leste e Central. Em termos de exposições aos títulos dos governos dos países de maior risco, todos os números são públicos, comunicados a cada trimestre, e nossa exposição a Portugal, Irlanda, Grécia, Espanha e Itália é de € 6,5 bilhões. É algo pequeno. O total de nossos ativos é de € 1,1 trilhão. A questão não é o impacto no custo de financiamento do Société Générale, que é gerenciável. O problema é como a Europa está sendo vista no resto do mundo. O que está em questão, fundamentalmente, é a evolução de três países, que representam 5% do total da economia europeia: Grécia, Irlanda e Portugal. Se você olha para a Europa como um todo, está melhor do que os Estados Unidos em termos de finanças públicas. Quando você agrega a dívida pública em relação ao PIB, a Europa está em melhor situação que os Estados Unidos. Mas nos EUA você tem uma vantagem política, que há só um governo federal. Na Europa não temos ainda integração. Por isso é mais difícil gerenciar uma crise nessa parte do mundo.

Valor: A crise no norte da África deve continuar a impactar os resultados do banco?

Oudéa : O que aconteceu na Tunísia, no Egito e na Costa do Marfim teve algo como € 60 milhões de impacto nos lucros líquidos. Nós tivemos de fechar os bancos por um prazo de 10 dias a 2 meses, o que significou nenhuma receita nesse período. Além disso, resolvemos fazer provisões, por questão de prudência. O que aconteceu na prática foi que todos os três bancos já estão reabertos e funcionando normalmente. Eu não posso prever como a transição política vai seguir adiante, quão suavemente, e o que isso vai significar nessas economias. É bem provável que o crescimento no PIB vá ser bem menor em 2011 do que se esperava no início do ano. Mas eu acho que a comunidade internacional vai dar suporte quanto mais ela quiser para ajudar na transição. Esses países têm potencial, uma população jovem, que é um problema, pois eles têm de achar empregos.

Fonte: Cristiane Perini Lucchesi, Valor Economico

marcos

Professor, Embaixador e Comendador MSc. Marcos Assi, CCO, CRISC, ISFS – Sócio-Diretor da MASSI Consultoria e Treinamento Ltda – especializada em Governança Corporativa, Compliance, Gestão de Riscos, Controles Internos, Mapeamento de processos, Segurança da Informação e Auditoria Interna. Empresa especializada no atendimento de Cooperativas de Crédito e habilitado pelo SESCOOP no Brasil todo para consultoria e Treinamento. Mestre em Ciências Contábeis e Atuariais pela PUC-SP, Bacharel em Ciências Contábeis pela FMU, com Pós-Graduação em Auditoria Interna e Perícia pela FECAP, Certified Compliance Officer – CCO pelo GAFM, Certified in Risk and Information Systems Control – CRISC pelo ISACA e Information Security Foundation – ISFS pelo EXIN.