Bancos chegam a cobrar R$ 0,01 para fazer emissões de debêntures
Acostumados a intermediar negócios na casa de bilhões de reais, os bancos de investimento têm lidado com cifras bem menores quando tratam da própria remuneração. No mercado de títulos de renda fixa privados, como debêntures, a disputa pelas operações chegou ao limite na emissão da Eletrobras, atualmente em andamento. Os bancos que ganharam a concorrência feita pela estatal para sua captação de R$ 2 bilhões em debêntures – Santander e BTG Pactual – cobraram apenas R$ 0,01 cada um para realizar a emissão.
Na prática, as instituições pagarão para trabalhar, já que ainda terão de arcar com as despesas de advogados e das apresentações a potenciais investidores – o chamado road show, no jargão de mercado -, de acordo com informações do prospecto da emissão. A estimativa é que esses custos sejam de pelo menos R$ 250 mil. Procurado, o Santander informou que não poderia comentar o assunto por se encontrar em período de silêncio. O BTG Pactual também não comentou.
O acirramento da competição ocorre em um momento particularmente delicado para os bancos de investimento. Com o agravamento da crise externa, outras fontes de receita, como a coordenação de ofertas de ações, praticamente secaram, enquanto as captações externas vivem de janelas de oportunidade.
As emissões no mercado local, que vivem um momento de euforia em razão do processo de queda dos juros, deveriam contribuir para pagar a conta dos bancos. De janeiro a julho, as captações via debêntures somam R$ 39,3 bilhões, o que representa um crescimento de 23,8% em relação ao mesmo período do ano passado.
Em busca de um pedaço desse mercado, vários bancos, incluindo estrangeiros e públicos, reforçaram as equipes de emissões de dívida local. Com mais competição, as comissões cobradas pelas instituições minguaram. “Os bancos que montaram grandes estruturas para atuar nessa área deveriam ficar preocupados”, alfineta um banqueiro que disputou a operação da Eletrobras.
Um outro executivo, que também preferiu não ser identificado, demonstra preocupação com o acirramento da competição. “Todos perdem com a guerra de preços, inclusive a empresa emissora”, avalia.
A receita obtida pelos bancos nas ofertas geralmente equivale a um percentual do volume de cada captação, e se refere ao trabalho de estruturação e distribuição dos papéis no mercado. Além da comissão, as operações de maior valor proporcionam visibilidade no mercado, por isso costumam ser as mais cobiçadas.
A emissão da Eletrobras se encaixa nesse segundo quesito. Embora não traga receita, a oferta deve garantir aos bancos uma melhor posição no ranking de emissões preparado pela Anbima, que considera o volume de operações distribuídas no mercado. O BTG é atualmente o segundo colocado, atrás do Itaú BBA e seguido de perto pelo Bradesco BBI. Já o Santander ocupa a sexta colocação, atrás de Banco do Brasil e HSBC, na quarta e quinta posições, respectivamente.
A operação da Eletrobras poderia ajudar o BTG a encostar na briga pela liderança do ranking, mas o Itaú BBA acaba de vencer um novo processo de concorrência para realizar uma captação de R$ 2,5 bilhões em debêntures para a empresa de transmissão de energia Taesa, da Cemig.
Para levar a emissão, o banco deu um lance considerado ousado pela concorrência. O Valor apurou que a operação da Taesa inclui uma captação prévia de R$ 1,2 bilhão em notas promissórias, para a qual o Itaú propôs uma comissão de apenas 0,01% e uma taxa de juros equivalente ao depósito interfinanceiro (DI), sem nenhum prêmio de risco. Como a emissão das notas só ocorrerá se as debêntures não saírem a tempo, os concorrentes agora torcem para que o banco seja obrigado a honrar o compromisso. Procurado, o Itaú BBA não respondeu ao pedido de entrevista.
Os valores cobrados pelos bancos para coordenar as emissões não são perfeitamente comparáveis, já que a contratação também pode ser feita a partir do relacionamento com a empresa emissora, sem concorrência.
Neste ano, por exemplo, a Oi pagou R$ 21 milhões aos bancos que coordenaram sua emissão de R$ 2 bilhões em debêntures, o equivalente a uma comissão de 1,06%. Na mesma época, a Cemig conseguiu barganhar uma remuneração de apenas 0,05% (R$ 675 mil) em sua oferta de R$ 1,35 bilhão, embora livrando os bancos da garantia firme – compromisso de adquirir os papéis que não forem vendidos aos investidores.
Apesar da comissão próxima a zero, os bancos ainda podem obter alguma receita com a operação da Eletrobras. Para atender aos requisitos do Novo Mercado de Renda Fixa, iniciativa da Anbima para aumentar a transparência nas ofertas, a estatal precisará, por exemplo, contratar uma instituição para atuar como formador de mercado, responsável por proporcionar maior liquidez aos papéis no mercado secundário. Esse serviço costuma ser prestado por um dos bancos que coordenam a oferta.
Ainda no caso de Santander e BTG, parte do valor deixado na mesa na oferta de Eletrobras pode ser recuperado em outras operações em andamento, como a da concessionária de rodovias Triângulo do Sol. A empresa do grupo Bertin pagará uma comissão de R$ 7,8 milhões – o equivalente a 1,25% da oferta de R$ 620 milhões – ao consórcio de bancos, que inclui ainda Bradesco BBI e Itaú BBA. A receita final pode ser ainda maior, pois a operação ainda conta com a chamada “comissão de sucesso”, paga pela empresa quando os bancos conseguem obter uma redução da taxa de juros que será paga aos investidores pelos papéis.
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